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Os dias são contados. O Tempo passa. E se caminha cada vez mais como se fosse um diário de um eunuco.

segunda-feira

Dia 79 - Nota Azul

Uma hora dessas, John Coltrane vai tocar a nota azul. Uma hora dessas, a gente vai deixar a quimbá de cigarro queimar a mão enquanto dormimos. Uma hora dessas, um cão vai uivar bem longe, na rua fria, enquanto o vento corta a noite, e outro cão responde enraivecido e babando em algum portão de grades. O filme vai tá passando mudo e á cores Samuel L Jackson limpar o sangue como profissão. Vai ter o frio no estômago e um sono profundo cada vez que pisca. Uma hora dessas, você vai ter fome, na hora do lobo, a hora onde crianças mais nascem e as pessoas mais morrem, a hora do ponto sem retorno no meio da madrugada, a hora da larica, a hora do miojo mal feito que você como al dente porque não tem tempo para esperar os três minutos. E o odor gostoso de produto de limpeza. A roupa lavada do omo, o químico da privada, o perfume da gare que desce de alguma vizinha que tomou banho ás 4 da manhã. Uma hora dessas, eu vou estar esperando responder todas minhas conversas, e rir, e pensar que tenho que dormir mas penso mais em você do que no meu sono e que sentir teu cheiro e seu olhar para mim é mais importante, e os filmes e as conversas e o Jorge e o Richie e o Danado e o ônibus e o fim da noite e o sorriso de chegar em casa e o tirar as calças e o banho enquanto espero responder espero comer espero ver te ver para esperar e o tempo que demora e o tempo que passa e o que passa e você e você e você que dorme que dorme que dorme...

Dia 78 - A Cabeça


Tudo o que eu criei e tudo que eu falo é falso. Somos todos seres de giz salpicado por estrelas. Nada aqui é real. Se você, tem alguma dúvida disso, olhe para si mesmo.
O que você escolhe ser é real?
Suas escolhas vão mais além daquelas que você planeja?
Eu quero que você se foda.
Desculpa. Eu sei que até agora você tava lendo isso, tudo isso e pensando, 'que porra de pessoa é essa?'. Pois é, eu sou real. As cartas que te mando não são. Aliás, você nunca me respondeu.
Sei  que devo esboçar alguma reação em você porque se você chegou até aqui, até agora, algo tem te tocado. Ou repugnado. Você vai ser sempre esse ser silencioso...
Talvez você fique até o fim. Talvez não. Talvez você se mate. Talvez não. Com certeza, eu faço isso. A ideia é essa, não é? Então, já sabendo o final dessa epopeia  mesmo sabendo o último capítulo, você ainda vai continuar por aqui? E se eu não terminar? Se eu parar no meio? A frustração vai ser enorme?
Eu nunca conclui nem executei nada na minha vida que pudesse ser citado como um grande feito.
E eu vou reclamar um pouco mais o direito de tentar ser algo que não sou. 
Só estou me usando de uma arte que ninguém se importa para tentar ser um pouco mais daquilo que me cabe não ser.
Eu sou a cabeça na beira da estrada de terra que você vê quando todos os rádios avisam para não passar naquela estrada pois um louco insano está matando motoristas. Você é o motorista. Que não consegue desviar o olhar da cabeça, que entra nessa estrada por curiosidade mórbida. E o louco insano é essa história sem moral nem ética. Sem papas na língua e tudo que eu quero é que a cabeça role embaixo do seu carro e você esmague ela.

sexta-feira

Dia 77 - O pior jogador do mundo




Eu sou o pior jogador de pôquer que existe. Não porque não sei blefar. Não é por isso. É porque eu sou honesto demais. Eu sou O Croupier da menor e maior cidade do mundo, Reno. É uma história antiga de Casino. Em Reno existia esse Croupier, que era considerado o melhor croupier que já existiu, ele mesmo sabia que ele era bom no que ele fazia, ele dizia que era tudo o que ele sempre quis fazer. Pessoalmente, ninguém acorda um dia dealer de cartas. Esse cara deve ter tido tantos subempregos, que eram tão subempregos que fizeram desse subemprego um emprego de verdade. E ele se sentia orgulhoso com isso.
O cara era bom no que fazia, bom demais porque ele tinha uma qualidade especial. Ele era honesto. A casa sabia disso. Os clientes habituais sabiam disso. Ele sabia disso. E isso fazia com que todos quisessem jogar na mesa dele por haver um jogo “limpo.” A casa não se impunha para mudar nada disso porque ele era o melhor. Um dia, souberem que um jogador que era considerado o melhor jogador ia para o Casino. E que provavelmente ia sentar-se à mesa do nosso Croupier honesto. Acontece que esse jogador era ótimo em contar cartas, e, o Croupier dava cartas no BlackJack, o objetivo do Blackjack é você acertar o número 21 usando as cartas de um baralho. Então, você só precisava ser bom de matemática e esse jogador era um ótimo contador de cartas. Ele contava rápido como ninguém.
 E ele veio ao Casino e sentou-se à mesa do Croupier. Começou a jogar e começou a ganhar. E continuou ganhando. E não parou de ganhar. Ganhou tanto que retirou 1/10 do valor de jogo da casa. No fim do jogo, o jogador se levanta e diz pro Croupier, “Muito obrigado pela noite. Você é o melhor Croupier que já joguei.” O Croupier agradeceu e o jogador foi embora. Mas, como todo casino, esse também era comandado pela máfia, e eles colocaram uma arma na cabeça do Croupier e interrogou ele dizendo que ‘ele tinha ajudado o cara! Vocês estão mancomunados. ’ E o Croupier negando tudo disse, ‘Eu fui honesto e vocês sabem disso. Fazem 5 ou 6 anos que trabalho aqui. O que ia mudar? Se vocês querem me matar, me matem, mas saibam disso: talvez a minha honestidade não seja a sua honestidade, mas eu estou sendo sincero para mim mesmo e eu sei que não estou mentindo. ’ E ele  tomou um tiro na cabeça. Bom, era a máfia. O que você esperava?  E não saberíamos também se era verdade ou não o que ele disse. Até que...
Alguns anos depois aquele mesmo jogador, agora aposentado, passou pelo casino e conversando com um dos gerentes perguntou sobre o Dealer. E, o gerente lhe disse que ele tinha sido demitido. Eis que o jogador responde, ‘ Poxa. Que merda. Você sabe... Ele era tão bom e tão honesto, que aquela foi a única noite que eu joguei sem roubar.’
O Casino, depois desse evento, nomeou umas das salas com o nome do Croupier. E isso me faz pensar em tanta coisa. Na nossa honestidade e na percepção do outro. Nós não estamos mentindo para os outros, nós estamos trabalhando com pontos diferentes de honestidades. E, basta você entender isso e aceitar. 

Dia 76 - Os Touros

Devem-se pegar os touros pelos cornos.

Não sei quem são os touros, nem quão afiados estão os cornos. 

Os mesmos animais bufam ar quente e jogam o bafo de carniça na nossa cara. 

O pior carniceiro é aquele que não se satisfaz com a sua carcaça. 

Eu tenho andado por essa cidade, esperando algo acontecer. 

Mas tem algo de muito errado comigo hoje. Não consigo identificar os bovinos. 

E mesmo que colocasse ensanguentado e mal passado no meu prato eu não saberia o que fazer.

Cortaria a carne com uma faca? 

Rasgaria nos dentes aquele pedaço de bife teso e frio? 

Existem bovinos demais e eu não sei identificar os touros das vacas. 

Os bois dos cordeiros. 

Hoje os algozes são os mesmos e as mesmas vítimas, o são.
 
Devem-se pegar os touros pelos cornos.

Mas que touros?

quarta-feira

Dia 73 - Eu merda.




Faz uns dois meses que a gente não faz nada. Eu e meu pau. Estamos em recesso condicionado. Primeiro pela porra da minha mente que não me deixava nas primeiras semanas. A pior merda que existe em se apaixonar por uma princesa é que depois todo o esgoto do feudo está na sua porta. Todo mundo te olha como se fosse o plebeu que achou que ia se dar bem. Todos querem sua queda. Sua derrota. E você fica comendo batatas e sorrindo pra si mesmo dizendo tá tudo certo, tá tudo bem. Tudo bem é o caralho.
Pra começar quando você deixa de beber algo tá ruim. Eu fiquei sem beber por um bom tempo e por mais que estivesse desistido dessa ideia fajuta de ficar nos bares, eu ainda bebia e não foi consciente a decisão. Foi algo parecido com a necessidade de tentar se justificar subconscientemente. Eu quero que se foda esse desejo íntimo todo.
Segundo, quando me recuperei disso tudo e os copos voltaram a ficar cheios, só tinha os copos e eu perdi o tato. Perdi o tato de como comer alguém. Perdi um pouco a vontade também. Eu peguei uma mulher de peitos e bunda farta. Essas falsas-gordas. Que na verdade são muito gostosas e que precisam de mais de um vestido e um olhar muito atento de um homem para ser notada que é gostosa. Mas não é maldade. É a mão da Mãe Natureza. E ela queria dar pra mim. A gente tinha marcado dia, hora, momento e até o que ia ser. A prévia do boquete noturno numa rua deserta de postes amarelados confirmava isso. Mas eu pulei fora. Disse, estou ocupado e não tô muito afim. Não é você. E não era mesmo. Era eu.
No começo, quando fui expulso do castelo, foi só contar para um conterrâneo no vale da solidão que todo mundo ficou sabendo. As notícias ruins se espalham rápido pra caralho. E ai voltou muito rápido o passado. Ai num dia, coisa que só acontece quando a gente não tem coragem nem de olhar pra própria sombra, uma loirinha linda que era cheia de intensões queria passar a tarde comigo. E ela queria dar pra mim. Eu sei que quando eu disse não, eu já sabia que ela não pediria de novo nem ofereceria alguma outra vez. Ela é desse tipo. E ai tem a mineira que deve fuder muito bem e ainda tá por aí. A mineira disse que podíamos andar pela praia, bater um papo e depois você poderia dormir lá comigo. Você vem? Oi. Eu ainda tô esperando sua ligação, pode ligar quando quiser. Hey, não sei se você recebeu minhas outras mensagens, mas eu sei como é foda essas horas, eu to aqui em casa e aluguei um filme. Passa aqui. Eu só respondi a última. Fica bem. Fico sim.
Agora eu estou curado, vivendo no mato, longe daquela merda de cidade e castelo falso. É bem distante e sinceramente me sinto melhor na Natureza. E têm algumas tribos aqui que ajudam a melhorar a vida na Natureza. E agora eu quero comer. Onde estão essas pessoas?
Precisei desse tempo todo pra poder me abrir com essa merda e tentar não me suicidar nessa cidade-fortaleza. Precisou eu talvez esquecer um pouco do que preciso fazer antes de fazer o que me cumpri a fazer. E precisou do telefonema. Precisou ir vê-la. E talvez eu teria riscado da lista mais um desejo. Mas ela foi me ver depois que eu desliguei o telefone. ela deve ter se levantado chorando e soluçando e deve ter ido assim a viagem toda até a rodoviária. Deve ter sorrido levemente pensando  que agora eu tinha voltado. E eu menti. Ela deve ter parado lá e me procurado um tempão. 
Eu sumido.
Eu não existido.
Eu merda.

sábado

Dia 72 - Não há nada de errado com o seu televisor

Não há nada de errado com o seu televisor. Não troque de canal. Não sintonize seu rádio em outra frequência. Não mude FM para AM. Não vale a pena. Não utilize o código Morse. Esqueça de ouvir o BIP do sonar. Não acompanhe o ponto verde na tela do radar. Não ajuste as antenas com bombril. Não bata na caixa metálica. Não há nada de errado com o seu televisor. A agulha não travou no mesmo ponto cego do disco. O leme não está seguindo a mesma direção do navio. O controle-remoto não precisa de novas pilhas. O fluído do Zippo não evaporou. A voz não está fora de sincronia. A direção não é autómatica. O celular não está sem bateria. A modernidade não parou. Não esqueça. Não há nada de errado com o seu televisor. Você só escolheu assistir o mesmo programa. A mesma rádio. Os mesmos toques. A mesma música. A mesma tempestade. A mesma voz. Porque você não é como os demais. Porque aqui nada parou. Nossa banalidade é uma estrada sem volta. Falta pouco agora mas não vamos sintonizar em outra estação. Não há nada de errado comigo. Não há nada de errado contigo. Não há nada de errado com o seu televisor.

segunda-feira

Dia 70 - Á beira do trilho



“Estou ligando porque estou bêbado e estou perdido.”
“Diga-me onde você está e o que você fez e eu te ajudo.”
“Eu estou perdido. Eu não sei onde eu estou.”
“Você deve saber onde está. Que diabos você está fazendo?”
“É o que eu venho me perguntando desde quando eu me conheço.”
Silêncio.
“É o que eu venho me perguntando desde quando eu decidi não te ver mais.”
Silêncio. “Eu resolvi ir atrás de você.”
Ela suspira desinflando de um balão cheio de ar. “Mas eu me perdi no meio do caminho.”
“Onde você foi?”
“Não posso.”
“Não fala isso.”
“Já cavei muitas sepulturas. Nenhuma delas era a minha.”
“Se fosse, você seria um morto-vivo.” Humor. Saudade.
“Não somos todos?”
“Continua fugindo assim e mais cedo ou mais tarde você vai acabar como o seu pai.”
Eu suspiro inflando o balão de volta.
“Eu deveria desligar.”
“Espera...” Eu espero.
“Sinto sua falta.” Eu engulo seco.
“Mesmo se eu me parecer com meu pai?”
“Eu amo você. Não o seu pai.”
“Te acordei?”
“Essa hora se alguém não tá dormindo, boa coisa não tá fazendo.”
“Nada de bom acontece depois das duas da manhã.”
“Ou é má notícia ou é você.”
“Ou os dois.” Risos.
“Sinto sua falta.”
“Você já disse isso.”
“Eu realmente sinto sua falta.”
“Eu...”
“O quê?”
“Também.”
Ela chora. Eu engulo seco.
“Quando você volta?”
“Pra onde?”
“Pra mim.”
“Eu não tenho pra onde ir.”
“Você pode sempre ir para mim.”
“Nós sempre temos um lugar para voltar.”
“Um Porto seguro.”
“Um lugar para parar de pensar e sentar.”
“Cheio de vento e cheiro de flores.”
“E com você.”
“E com você.” Nos falamos juntos. Ela não esqueceu.
“Onde você está?”
Eu respiro fundo. Engulo o ultimo amaro da cerveja.
“Na rodoviária.”
“Você está vindo?”
“Não.”
“Por favor. Eu preciso de você.”
“Eu sei.”
“Se você sabe por que você não vem?”
“Porque eu já estou aqui.”
Silêncio. Ela para de chorar. Eu começo. Silêncio. O balão levita. Eu enxugo a lágrima.
“Eu não tenho para onde ir.”
“Sim.”
“Eu estava pensando...”
“Sim.”
“Eu tô muito bêbado.”
“Eu sei.”
“Eu acho que te amo.”
“Sim!”
“Sim.”
“Eu também.”
Silêncio. Choro feliz de criança. “Eu tô indo ai.”
“Sim.”

De volta. Aqui. 

quarta-feira

Dia 65 - O Bar



Nós estamos aqui. Todos nós. Todos aqui nesse caldeirão. Todos procurando alguém ou alguma coisa. Então não se escondam seus apostadores de vida dupla. Venham. Seus homens de cabelos repartidos e óculos fundo de garrafa. Todos os viajantes sem destino. Todos os introvertidos que são alvos de risos distantes. Todos os mártires sem motivo.  Venham todos sem exceção. Cada homem desconhecido, cada lenda da noite.
Cada um de vocês que respira e anda não é nada nessa imensidão noturna, esse mar de bares que chegam em vagas.  Venham, pois juntos, somos uma força maior que a Natureza. Juntos somos mais desajustados. Mas somos uma força a se admirar. Uma fonte a se beber.
Todos vocês, venham!
Seus sonhadores com insônia. Seus visionários cegos. Seus pintores de esmaltes e cantores de churrascaria. Venham. Todos vivem aqui. Cada general de cinco estrelas sem família. Cada motoqueiro que se acha motociclista. Cada santo e pecador. Cada ganhador e perdedor. Vocês todos cabem aqui. Tem lugar no balcão. Cada menino aventureiro. Cada mulher que não se sacia. Temos espaço. Para cada um com sua doutrina, suas ideologias, suas religiões, cada um que sofre e sorri, cada caçador sem prêmio e cada carniceiro de espólios. Nós temos espaço para vocês!
Cada criador e criatura. Todo destruidor de lares, reis ou plebeus, jovens ou anciões. Cada inventor e explorador, pessoas com esperança, sofredores de ocasião, cada mãe e pai, todo casal jovem apaixonado que se olha nos olhos e fala baixinho sem perceber o que se passa em volta. Tem uma mesa reservada para vocês.  Os líderes supremos de cozinha. Os “estrelas de rock”. Cada politico corrupto amigo de professores de moral e cívica.
Venham ao menor palco da vasta arena da vida. O bar. Pense nos rios de cerveja derramados nas mesas para que a felicidade e a bebedeira rolassem. Pense nos deuses antigos que querem ser elogiados. Nos santos africanos. Pense nos habitantes que dormem vomitados na esquina, como eles não são compreendidos, e nós assistindo tudo também somos promotores de desentendimentos. De conspirações de mesa de bar. Nossa pose, Nossa autoestima. Nossa assumida auto importância. Nessa vastidão, há espaço para todos nas mesas, colocando moedas na caixa de músicas. Há mais para viver aqui na noite seguinte. Quando a luz se vai novamente e todos nós voltamos.

Dia 64 - Onde não se Ama



O único lugar onde não se deve ter amor por quem ama é na cama.
Tem de ter odio e força e a natureza entrando pelos poros... é chover e molhar a cama, sentir o cheiro de grama, é queimar os lençois e torrar o cedro da armação de toda labareda, é a brisa da manhã, o barulho das ondas nos ouvidos, mergulhando salgado-doce no outro.
É sentir a lagrima escorrer quando a garganta for preenchida.
É mão tensa e abrir dolorida, alguns parcos fios de cabelo.
Ajoelhar sob a sua superioridade. É beijar seu pé aceitando o sofrimento que terei.
é aceitar que deus criou a mulher depois do homem, dando-lhe para seu divertimento.
Saber que cachorro é homem, mulher é cadela e que toda sorte de animal se encontra dentro da noite. Do mais puro coração dividido entre o cavalo e o alazão.
É esquecer sexo, identidade e sem essa hipocrisia de ser um só, dois putos para o fim.
Fim de tudo. É sentir sair de si para o outro, em cada movimento. A cada bombada, sou mais sua, que de mim própria. Imensa mentira contada para agradar.
Onde eu assino para casar com uma puta como você. Imensa alegria de querer acreditar naquilo que acontece quando é tortura.
Quando masturba só para sofrer e para, morde, bate, volta e você quer que acabe o que não deveria.
Acabar com o que é intocado, destruir o que é belo. Decorar de suor corpo arranhado pelo diabo da carne. Arre, que não tem valor maior, fogo de palha em pernas finas. Saias rodadas, gravatas, óculos, só avental na cozinha-cama. Todo fetiche de punir e amar.
Que acabe suas forças antes de meu gozo.
Que suma sua dignidade e confunda com amor essa porra toda.
Entenda como quiser.

segunda-feira

Dia 63 - Minhas tendências



Tenho uma tendência natural a ir contra. Não porque é meu estilo partir do outro ponto de vista. Naturalmente eu não gosto de lutas. Nunca gostei de conflitos e quando alguém discorda fervorosamente com alguma opinião eu tendo a calar. Tá certo. Cada um tem seu ponto de vista.
Tenho uma tendência natural a desconfiar de quem não gosta do Capitão América. Nem quem não vai com a cara de puta no meio da rua. Puta paga. Não, puta dada. Tenho receio de odiar quem diz que odeia filme de faroeste. Quiçá ficção científica. Quando alguém diz que não entendeu ‘Onde os Fracos não têm vez’, pra mim não merece assistir Blade Runner. Tenho uma tendência natural a beber sempre a mesma bebida. Cerveja ou um Long Island Ice Tea. Drink é coisa de viado? Ernest Hemingway adorava touradas, viajou o mundo todo como jornalista, era boxeador e adorava brigar com qualquer um que encontrasse, além de ter servido a marinha. Sua bebida favorita era o daiquiri.
Também gosto de cabelos. Extremos se encaixam mais aqui. Cabelos coloridos ou sem química alguma, cabelos loiros platinados, vermelhos e alaranjados, ou castanhos escuros, de preferência, naturalmente ondulados. Cabelos grandes de Argentinas ou curtos francesinhos. Não gosto de unhas pintadas, mas adoro as cores que as mulheres escolhem. Se mulher comprasse e consumisse como homem, ia haver duas cores de esmalte. Preto-bar, Vermelho-futebol. Sobre extremos, preciso decorrer mais um pouco. Alta ou baixinha, nunca a média. Sarada ou bem magra, nunca a gorda. Tenho tendência a não gostar de gordas. Sem ofensas. É pessoal. Tudo aqui é pessoal.
Não tenho mais do que dois pares de sapatos preferidos. Normalmente, são só os que eu uso. Normalmente, eu me prendo á eles. Adidas SL 72. Se alguém achar um pra mim, eu pago um Long Island.  Tenho tendência á pagar bebidas para amigos. Dinheiro gasto entre amigos é sempre um dinheiro bem gasto. Mas nunca com conhecidos. Eu tendo a ser direto e objetivo e não escondo meus sentimentos. Não sou ciumento, mas preocupado. Não sou preguiçoso, mas sou relapso. Sou perfeccionista no meu lar, mas desorganizado na minha vida. Estou indo bem até agora. Ninguém morreu por causa de mim. Uma pena.
Se você nunca atirou em nada, você não sabe o que está perdendo. A sensação de poder é incrível. Mas armas de fogo são para fracos. Use um arco e flecha. Confie em mim. Quem ver vai achar maçante. Mas, quando aquele pedaço de madeira fazer um zunido e passar como um zangão rente ao braço de suporte, e você ouvir o ‘tum’ no alvo, você vai ter a tendência de querer usar em algum objetivo vivo. Fique nos objetos estáticos. Confie em mim. Caçar só é emocionante na prática. E coelhos são rápidos.
Tenho tendências a ouvir jazz. Amo rock n roll e qualquer outra vertente. Mas eu sempre ouço Jazz numa banda de heavy metal.  Quem não entende isso, eu vou contra. Odeio luz fosforescente, mendigo sem senso de humor, quando a cerveja acaba, brigar com familiares (porque não dá pra evitar e a intimidade faz com que não importa o quanto você acabou a briga, ela continua), odeio barulho, mas ouço música alta, odeio série de menininhas, mas assisto filme romântico, uma coisa é uma história fru-fru por algumas horas, outra é fru-fru por alguns anos e ter que acompanhar. Tenho tendência a exagerar, mas tudo que é demais cansa. Odeio moda e suas tendências. Eu ainda vou aos mesmos lugares e frequento os mesmos bares, as mesmas filas de banco, e, torço pelo mesmo time. Não tem essa de em São Paulo eu torço pro Santos. Tomar no cú. E eu tenho tendência a xingar quando não sou entendido. Vai ver se um gringo não sabe o significado universal de um belo puta que pariu. Não adianta você me dizer que todo mundo faz, ou é a mesma coisa, porque minha cabeça dinossauro ainda vai dizer pra mim que não. Seja plausível. Tenho tendência a não entender “porquês sins”. Eu sou do contra. Mas só porque eu não conheço o á favor e me parece que nada é á meu favor.
Então eu continuo com meus pisantes, meus filmes, minhas bebidas, meus textos longos  e mesmo assim eu vou ser o mesmo e esperar você. Eu tenho uma tendência a esperar a mulher que mais amo. Mesmo ela não sabendo disso. 

sábado

Dia 62 - Formaldeído


É mais um dia daqueles que por acaso é noite. Ela tá sentada na cama, deita e dorme. Ela fica assim, abraçada num sonho.
E as vezes, no meio da noite ela acorda e se abraça à mim. Ela não só acorda e se abraça à mim, como ela tem um pesadelo.
O que será que ela sonha? Será que ela sonha com vampiros e aviões caindo? Com nuggets com pernas correndo atrás dela?
O que será que ela sonha?
Ela não deve nem imaginar que eu já não estou ali há muito tempo. Essa manhã, uma carta chegou.
Uma carta de longe dela. Eu sei que é dela porque já é a quarta esse mês. E pelos vistos, eu vou ter que riscar mais um item da minha lista.
Mais um item e daqueles que não dá pra deixar pra depois. Porque pode não haver depois.
Em outras notícias, eu conheci um cara hoje. Um cara normal com trabalho excepcional pra mim.
Eu estava caminhando na feira e um cara bem pra lá de bebado estava brigando com o dono do pastel de feira.
Ele articulava que  o chinês tinha cobrado mais caro e dizia que se ele fosse queimado pelo óleo e fosse pro necrotério, ele não "entubaria".
Repetiu isso umas vezes, e o tempo fechou muito rápido pra que eu não fizesse nada. Eu tava muito perto e perto estava da figura.
Achei melhor me meter e retirar o cara da barraca do china. "Desculpa, Zé. Tem sempre alguém assim. Põe na minha conta."
"Luis, você conhece esse merda, é? Um menino tão bom deveria andar com pessoas melhores e mais respeitáveis." "Pô, Seu Zé, eu não..." "Respeitável é a sua bunda amarela!"
E isso foi o estopim pro Seu Zé pular pela barraca e atacar o pescoço do maluco. Sorte que os outros feirantes seguraram o china, que vamos combinar: É bem brabo para um homem de seus sessenta anos.
"Sai daqui, seu bebâdo! Sai daqui!" E eu saí arrastando o maluco que aos trancos e barrancos trocava passos pela avenida da Glória.
Sinto que meus Domingos nunca mais serão os mesmos. Levei o sujeito para um bar próximo. O IML dos bebâdos. E sentei ele.
Pedi, óbvio, um suco. Sei lá. Tava me sentindo um santo e tinha que dar o exemplo. E era cedo. Que foi? Minha vida e eu mudo ela quando quizer. Você já deveria ter percebido isso antes.
"Bunda amarela baitola." E, lá vamos nos...
Uns quinze minutos de como o viado do Seu Zé queria roubar ele, entrecortados por ele ser paulista, morar no Rio há um tempo e trabalhar no necrotério da cidade, fez de mim seu melhor amigo.
Tá explicado o "entubar" dele. Entubar a mangueira. No bom sentido, mas no momento ruim. O Formol. Sacanagem. Deixar o Seu Zé morrer apodrecendo na frente dos parentes e amigos quando dava pra dar uma recomposicionada na laje.
Subir um duplex na carcaça cansada do Seu Zé, que é chinês e sim, tem nome português. Que me acha um menino tão bom. Seu Zé deveria entender as pessoas por dentro. Não o que ela vê por fora. Além do mais, eu só como pastel e miojo.
Sou praticamente um chinês e as duas comidas são uma merda. Logo, eu sou o que? Você é o que você come. E hoje, nem comer eu comi.
Ficar fedendo no caixão do Seu Zé deve ser uma merda. Uma mistura de óleo e carne indo pro além. Me inteirei mais sobre o assunto Formol, necrotério e quem paga a conta.
Na verdade, ele falou que ia no banheiro e eu acreditei. E o pior que nem sei o nome do puto porque ele já tá longe e eu paguei sim os bolinhos que ele comeu no bar, o Seu Zé porque é parceiro,
e ainda continuei passando fome. O puto deixou um bilhete com um número e disse pra eu ligar pra gente fazer alguma coisa. Que se não fosse eu, o "Bruce lee tinha me levado pro meu trabalho como objeto de estudo."
Eu ri. Esse cara ainda vai me servir pra alguma coisa no futuro. Eu sei.

Dia 58 - Loucura

Têm cidades que enlouquecem as pessoas.
Têm pessoas que enlouquecem na cidade.
Fotofobia.